Poderá parecer estranho a muitos, e em particular a quem me julga conhecer, que eu me debruce, mesmo que sucinta e superficialmente, sobre um tema difícil, sensível, para alguns esotérico ou nebuloso até.
Eu, médico, especialista em cirurgia e em urologia, que participei em tantas missões humanitárias concretas, na tentativa quantas vezes infrutífera e inglória de salvar umas vidas. Eu, o homem com os pés bem enraizados no solo terreno, porque se assim não fosse não teria sobrevivido sem enlouquecer, de tanto ter convivido com o sofrimento alheio, e até com o meu, o que tenho eu a ver com a espiritualidade e até mesmo com a religiosidade?
Mas tudo! Nunca poderia ter feito o pouco que fiz se não tivesse os pés bem enterrados e simultaneamente a cabeça, nas “nuvens”! Foi porque permanentemente me interroguei sobre a minha própria essência e sobre a razão profunda de ser da minha efémera existência, que sempre levantei os olhos para os meus semelhantes e para o “céu” à procura de explicações e, porque não dizê-lo, de consolo.
À eterna questão que sempre se me colocou com particular acuidade, “de onde venho e para onde vou”, questão eterna que desde tempos imemoriais o ser humano racional se coloca (ainda há uns anos a vi gravada no México numa estela Olmeca do século VIII d.C.), a pouco e pouco fui encontrando resposta no contacto com outros povos, outras culturas e com alguns violentos embates que a vida, geralmente generosa para comigo, me foi reservando.
Hoje sei (é das poucas certezas que tenho nesta fase outonal da minha passagem terrena) que a razão de ser da minha existência é - sortudo que fui em nascer com o acesso ilimitado à cultura, ao conhecimento e aos outros povos – a de tentar dar o meu contributo para que os meus irmãos do mundo sofram menos e para que todos eles, assim como a minha mulher, meus filhos, familiares e amigos possam viver com dignidade e, se possível, contribuir um pouco para a sua felicidade.
Membro de uma cadeia fraterna sem fim, vinda de nenhures e a caminho da sua total plenitude e harmonia, eu, poeira infinitérrima, sou insubstituível, como todos vós, porque sou único e parcela dessa entidade que se convencionou apelidar de Deus ou de outros milhares de nomes. Sem mim, sem vós, sem todos nós em união, esse Deus está incompleto e possivelmente ferido de morte.
Para mim, é esse o sentido da Espiritualidade. Sem essa Força que move montanhas, continentes, planetas e galáxias, nada seria possível! Só Ela permitirá que ultrapassemos os nossos mortíferos egoísmo, indiferença, intolerância e ganância que tantos genocídios tem praticado entre nós, fazendo-nos compreender o seu completo “não senso”.
Só ela, a Espiritualidade, nos permitirá, com “os pés no chão e a mente no rodopio das galáxias” vencer os desafios globais e implementar soluções esperançosas como a Espiritualidade Global Fraterna.
Já tenho idade, vivências e conhecimentos acumulados suficientes para dizer exactamente o que penso, quando e onde entender, sem insultar ninguém.
A Espiritualidade exige frontalidade com Amor. Pouco me importa o que as carpideiras disserem. A minha preocupação é deixar bem claro quais são as minhas opções de fundo e qual é a visão que eu tenho para o Mundo, o Universo e o meu País, Portugal. Esse é o meu Dever e o meu Direito mais sagrados de que não abdicarei jamais como ser livre e centelha divina que sou, à semelhança de todos vós.
Acredito que a verdadeira e bem entendida Espiritualidade nos conduz inevitavelmente para o valor mais sublime: a Solidariedade activa para com o nosso irmão mais infeliz, último nome de Amor.
Assim acredito. Assim tento e tentarei actuar até ao fim: com dignidade e coerência teimarei em dar o meu singelo contributo para que entendamos todos que o que está verdadeiramente em causa é uma imperiosa e profunda mudança do paradigma das relações entre os seres humanos. Se assim não for, nada será duradouro e as Crises suceder-se-ão com o seu infindável cortejo de sofrimento para muitas centenas de milhões de seres humanos.
Temos que apostar nos Valores Universais, tais como o Amor, a Ética, a Equidade, a Justiça, a Tolerância, o Perdão, a Solidariedade, a Fraternidade, a Dignidade, a Honra e o Civismo… sem os quais nada será possível, nomeadamente o restabelecimento da insubstituível e indispensável confiança entre os Cidadãos, o Estado e o Mercado. Isso também é Espiritualidade…