Haja Esperança!
Dois anos volvidos sobre o romper da crise financeira mundial, permito-me dizer que algumas decisões revelaram-se extremamente esclarecedoras. Por um lado, a capacidade de mobilização de capitais financeiros pelos Estados, quando verdadeiramente motivados para o fazer. Por outro, a sua incapacidade para, com rapidez e determinação, regulamentarem de uma vez por todas as transacções financeiras “tipo roleta russa” e exemplarmente punirem os prevaricadores que afectaram a economia global e a vida de centenas de milhões de pessoas.
Seria muito laborioso e longo discutir agora e aqui se a injecção maciça de capitais e avais foi o melhor caminho de actuação. Penso sinceramente que os débeis, aprisionados e armadilhados Estados não tinham verdadeira alternativa perante a violência da situação que ameaçava muito claramente levar à derrocada do errado paradigma civilizacional actual.
Derrocada essa, provocada pela grande maioria dos “gestores” financeiros e da “classe” política, que, demitindo-se das suas nobres, porque éticas responsabilidades sociais de governação (o ajuizado e íntegro respeito pela “res pública” que se reflectia na saudosa divisa “Pela Lei e Pela Grei” do insigne estadista D. João II), se tornaram puros servos do capital mais nefando com a sua mortífera especulação sem freios, a dita “economia de casino” e os seus “gananciosos e nebulosos produtos tóxicos”.
Quando para os “líderes”, os direitos se sobrepõem aos deveres, o descalabro é sempre inevitável! Tal já aconteceu na História, seja com monarquias ou repúblicas, devido às respectivas “aristocracias” e elites vaidosas, balofas, gananciosas e adulteradas porque sem honra, nobreza de carácter ou coluna vertebral!
Não admira pois que os Estados se ajoelhassem perante o desvario da alta finança e as subsequentes ondas de pânico avassaladoras que tudo e todos fizeram, e ainda fazem, tremer… assim como não admira os passes de magia, milhões de milhões a saltarem de nenhures de estados super endividados, com que fomos contemplados.
Não nos esqueçamos porém do rasto de profunda miséria que se alastrou, como consequência directa dessas enormes fraudes, para uma parte muito significativa da população do planeta Terra.
Porém, duas questões essenciais carecem de respostas e esclarecimentos cabais:
1- Como foi possível mobilizar-se em cerca de um ano, mais (muito mais… quem sabe ao certo?) de 18 milhões de milhões de USD (18.000.000.000.000) para tentar estancar a loucura devida a alguns gestores gananciosos (e mesmo assim ninguém ousa garantir que tão faraónica quantia chegará para evitar o desmoronamento da muralha de areia criada à nossa volta para restabelecer a imprescindível confiança, sem a qual nada será nunca mais possível)?
2- Como é possível que as Nações Unidas, até hoje, não tenham conseguido mobilizar os necessários e “míseros” anuais 25 mil milhões de USD (25 000 000 000), ou seja, 720 vezes menos, para que em 2015 fossem atingidos os propalados Objectivos do Milénio (ODM), tão essenciais para o futuro da Humanidade, pese embora aprovados por todos os chefes de governo presentes na famosa Cimeira do Milénio em Nova Iorque em Setembro de 2000?
Estou certo que não faltarão por aí distintas luminárias para responderem, com enorme cinismo é claro, a tamanha falta de humanismo e de inteligência… São as mesmas luminárias que dizem sempre dormir o sono dos justos apesar dos desmandos globais que, enquanto “responsáveis”, incentivaram ou encobriram! Como é possível tão descarados ladrões, insaciáveis e incompetentes não verem todos os seus bens confiscados e estar na cadeia?
Estarão à espera que as bombas sociais nos rebentem na cara nos quatro cantos do mundo? E quem irá acudir? Nós os humanitários de serviço, já com pouca pressão nas mangueiras para sermos eficazes perante a grandeza dos incêndios que já se vislumbram? O mundo está mesmo inquietante.
Porém, acredito que ainda existem razões para ter esperança.
Na quarta-feira, o relatório anual de avaliação dos Objectivos do Milénio revelou que a taxa global de pobreza deverá cair para 15% até 2015, o que significa que 920 milhões de pessoas continuarão a viver abaixo da linha da pobreza, ou seja, metade do número total de 1990. O mesmo documento mostrou ainda que foram alcançados progressos significativos no acesso à educação primária na África Subsaariana e na saúde infantil e igualdade de género na América Latina e Caraíbas.