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Contra a Indiferença

A visão de um cidadão activo e inconformado com certos aspectos e da sociedade.

A visão de um cidadão activo e inconformado com certos aspectos e da sociedade.

Contra a Indiferença

11
Set10

11 de Setembro: 9 anos depois...

Fernando Nobre

Este texto foi escrito no dia 17 de Setembro de 2001, seis dias após ter assistido ao total desmoronamento das duas torres do World Trade Center em Manhattan – Nova Iorque, na trágica terça-feira do dia 11 de Setembro.

 

O acto de terror do dia 11 de Setembro, com os seus milhares de vítimas inocentes, vítimas da loucura assassina nascida do ódio, ódio criado e alimentado pelas injustiças e pela falta de princípios éticos iguais e válidos para todos, marcou o início de uma nova época repleta de medos e incertezas.

 

Ao ver desmoronar-se, a poucas centenas de metros de mim, como simples castelos de areia, , aquelas duas enormes torres que conhecia por dentro, gritei como as milhares de pessoas que, como eu, na 5ª avenida assistiam aterradas, atónitas, aparvalhadas, incrédulas e impotentes ao impossível: Meu Deus! Inacreditável!

 

Tentei imaginar então os seres humanos, homens e mulheres, encurralados em pânico, no calor, na poeira e esmagados por toneladas de betão e ferro: nunca irei esquecer. Eles eram meus irmãos também! Não há justificação possível para tal horror. Passado, mas nunca aceite, esse intenso momento de dor, tristeza e de estupefacção, perguntei-me, tentando compreender o porquê de tal loucura assassina e suicida. A resposta, para mim, é só uma: Injustiça! Injustiça! Injustiça associada ao desprezo, à prepotência, à arrogância, à intolerância, à indiferença, à ganância!

 

Hoje há muitos povos (conto também com os nossos excluídos), que, vítimas de injustiças, estão cheios de ódio para com o outro, você, eu e o Ocidente rico, opulento, gastador, injusto, opressor e indiferente à miséria alheia. Os Estados Unidos infelizmente representam o vértice de todo esse sistema que tantos ódios tem criado e que está a levar indivíduos, e poderá levar povos inteiros, à loucura assassina e suicida. O apoio manifestado pelos EUA (e não só!) a muitos ditadores sanguinários, o seu apoio incondicional e cego a Israel, mesmo quando este último se comporta injustamente, brutalmente e à revelia das sucessivas decisões das Nações Unidas há décadas, a não ratificação de tratados internacionais tais como o de Quioto, o da não proliferação das minas pessoais e do Tribunal Penal Internacional (TPI), a política arrogante do quero posso e mando, desprezando, por vezes, toda a comunidade internacional e as próprias Nações Unidas, faz com que o ódio que certos povos lhe votam tenha atingido dimensões nunca imagináveis. Chegou o momento de todos (americanos, europeus asiáticos, africanos, judeus, muçulmanos, cristãos, hindus, budistas, ateus e animistas) pararmos para pensar e reflectir.

 

O que o Mundo precisa é de profunda reflexão que este acontecimento trágico deve proporcionar: é uma oportunidade única de interrogação que não deve ser desperdiçada.

O que o Mundo não precisa, nem nunca precisou, é dos espalha brasas que não sabem o que é ver morrer de perto e em massa. Calem-se, senhores espalha brasas: tenham vergonha e sejam púdicos, por favor! É tudo muito mais complicado do que as vossas mentes maniqueístas e primárias pensam: Não há só cowboys bons e índios maus...

O que precisamos todos é de pôr já um bálsamo nas nossas dores e chorarmos todos os nossos mortos, os mortos do World Trade Center, os mortos palestinianos, os mortos israelitas, os mortos iraquianos, os mortos cambodjanos, os mortos dingas do Sudão, os mortos angolanos, os mortos colombianos, os mortos russos e chechenos, os mortos hutus e tutsis, os mortos índios, somalis e afegãos...

 

Depois desse lamber de feridas, com a sua devida e honesta autocrítica, que permita exorcizar todos os nossos fantasmas, precisamos todos, em consciência, de nos empenhar completa e resolutamente em acabar com as causas de tanto ódio. Se não o fizermos já, entramos no caminho infernal e sem fim do ciclo do horror: atentado, retaliação, atentado, retaliação,...

Li certa vez na rua o seguinte grafitti: “ A lei de Talião - olho por olho torna o povo cego. É bem certo. O diagnóstico da doença do mundo actual é o ódio!

As manifestações dessa doença mortal são: revoltas, frustrações, desespero, atentados, loucura assassina. Só há um tratamento com hipótese de cura a médio – longo prazo: justiça social e ética nas relações entre os povos. A paz no Médio Oriente, nos Balcãs, em África é urgentíssima. Ponhamo-nos à mesa já. Como teremos paz e justiça, únicos antídotos do ódio mortal que se alastra, com, por exemplo, um TPI (Tribunal Penal Internacional) válido para julgar, nomeadamente, os criminosos contra a Humanidade sérvios mas nunca válido para julgar, eventualmente, pelas mesmas razões um criminoso contra a humanidade americano?

 

Peço aos meus amigos americanos, e são muitos, que pensem bem pois eles precisam do Mundo (como os outros povos) e o Mundo precisa deles (como dos outros povos): só com eles poderemos parar a espiral da violência. O Mundo não precisa de uma PAX AMERICANA arrogante! Por favor, compreendam isso.

 

Para sermos respeitados precisamos também de respeitar os outros. Um povo humilhado serão milhares de potenciais homens bombas lançados aos quatro ventos! Será que queremos vê-los saltar pelas nossas cidades à semelhança do que se passa em Israel?

 

O atentado do World Trade Center demonstrou que, daqui para o futuro, ninguém está imune de morrer inocente e estupidamente num massacre bombista e que nada, nem ninguém, é invulnerável. Entramos numa nova era: de horror ou de esperança, em função da seriedade com que se enfrentar esta tragédia. Não nos esqueçamos da enorme esperança, completamente desperdiçada, que tinha nascido há uma década com a queda do muro de Berlim que, dizia-se, ia dar nascimento a um mundo mais justo. Tal não aconteceu: é agora ou nunca!

 

Não nos esqueçamos que um homem decidido a vingar-se e a pagar com a sua vida foi, é e será sempre muito difícil de dissuadir na sua loucura. Ainda vamos a tempo de parar. Paremos pois já! Sejamos claros: Há que julgar e castigar os culpados do atentado ao World Trade Center, disso ninguém tem dúvida. Mas há que o fazer segundo as normas jurídicas internacionais. Estou convicto que ao responder ao terror pelo terror dificilmente sairemos do terror em curso. A única via para se conseguir uma paz duradoura é no combate sem quartel contra o ódio e a injustiça.

Ao ódio e à loucura assassina contraponha-se já justiça e ética. Se assim não for, não sei onde iremos parar: a caixa de pandora aberta, os cavaleiros do apocalipse estarão de rédea solta... E depois?

Não aceito tanta insensatez, tanta loucura.

 

 

Nada é tão nefasto como a perda ou a ausência de memória dos povos, que tende a fazer deles inevitavelmente sempre ou heróis ou mártires, e nunca culpados de nada. Esse comportamento leva à vitimização, à intolerância, à xenofobia e à discriminação. Quero só lembrar aos ingleses os campos de concentração na guerra dos boers na África do Sul e o genocídio dos aborígenes na Austrália (não ficou um na Tasmânia) e, aos americanos, quero só lembrar o genocídio dos índios e o famigerado Ku-Klux-Klan.  Poderia passar assim em revista a história de quase todos os povos unicamente para lhes dizer que as “democracias” tão badaladas têm manchas e que somos todos cinzentos.  Pensemos em consciência!

 

 

Quase uma década depois deste nefasto acontecimento, considero que há na política internacional uma nítida mudança positiva em curso desde a eleição do Presidente Barack Obama, que representa a mudança no paradigma de governação do primeiro império da actualidade, demonstrando solidariedade para com os mais desfavorecidos, vontade em terminar guerras que herdou (Iraque e Afeganistão) e em melhorar o conflito no Médio-Oriente entre Israel e a Palestina, interesse pelo que está a acontecer no continente africano, e tendo recolocado os EUA no multilateralismo, pois acredita, claramente, no diálogo.

 

Porém, Barack Obama só, não chega. Temos de multiplicar pelo mundo o seu genuíno interesse pelos outros e a sua visão de entendimento e paz mesmo se, por vezes, manietada por forças e circunstâncias nefastas.

 

Aliemos as nossas esperanças à ONU e às ONG’s de todo o mundo, cuja 63.ª conferência terminou no passado dia 8 de Setembro em Melbourne, deixando um apelo aos líderes mundiais para que reduzam as despesas em guerras e aumentem o apoio na ajuda ao desenvolvimento.

 

A declaração final da conferência alerta para o facto de, em todo o mundo, 2600 milhões de pessoas viverem sem acesso a cuidados de saúde, 8 em cada 10 pessoas das áreas rurais não terem água potável, 340 mil mulheres grávidas morrerem todos os anos de causas relacionadas com a gravidez e 9 milhões de crianças não chegarem a completar 5 anos.

 

Há que mudar certas lideranças em todos os continentes para darmos uma oportunidade à Humanidade.

Façamo-lo também em Portugal. Por isso me ergui: contra ninguém, mas com a determinação de uma mudança humanística também entre todos nós. Olhemos pelo outro, nosso irmão.

 

 

Quero acreditar que os nossos filhos e netos conhecerão um mundo diferente e melhor, mais fortalecido e mais justo.

 

 

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