Água, Património da Humanidade: essencial à Vida, ameaça à Paz
É um lugar-comum dizer-se que a “Água é vida” mas não deixa de ser cientificamente exato quando se sabe que o ser humano é cerca de 70% água e que ela é essencial na constituição de todo o organismo vivo, animal ou vegetal, que integra a nossa biosfera.
Por outro lado, é fundamental entendermos todos que o conjunto do mundo hídrico – a hidrosfera – rios, oceanos, glaciares, lençóis freáticos, humidade, em conjunto com a atmosfera e a biosfera constituem um bem comum, partilhado e partilhável por todos nós, um verdadeiro Condomínio da Terra. Ora, a sua preservação é vital para o futuro da nossa espécie e a sustentabilidade da sobrevivência da civilização humana no planeta Terra a médio prazo (100 a 300 anos).
Há pois que procurar ter bom senso na sua conservação e ser equitativo na gestão e distribuição desse bem coletivo, precioso e insubstituível que é a Água. Para já, não é o caso e as disparidades são brutais.
Senão vejamos: em média, um norte-americano gasta por dia (para beber, cozinhar, higiene pessoal, lavagem de roupa e loiça, jardinagem, lavagem do carro, agricultura industrial, agropecuária…) cerca de 400 litros de água, um europeu 200 a 300 litros, um cidadão de um país menos avançado 30 a 50 litros e uma pessoa num campo de refugiados, cerca de 15 a 25 litros, já para não falar de certos seres humanos em situações de extrema privação que se contentam com 2 a 5 litros, ou até menos… Claro, não?
A não resolução atempada, isto é imediata, deste premente desafio, provocará grandes guerras no século XXI. Aliás, já provocou: a chacina do Darfur também tem obviamente a ver com a questão do controlo da escassa água de superfície para satisfação geral da pastorícia e da agricultura…
O controlo das nascentes dos rios e suas bacias hidrográficas, dos lençóis freáticos e rios subterrâneos rapidamente se tornará na questão central de conflitos violentos. Em caso de penúria grave deste bem tão precioso, a Água, esses conflitos nem sempre, ou raramente, serão dirimidos pelo Direito Internacional.
Será o direito da força a ditar as regras da sobrevivência.
Basta pensarmos que no Sahel as mulheres andam em média 10 a 15 Km para se abastecerem de água num poço, enquanto nós, em nossas casas, felizmente, basta-nos abrir uma torneira para tomarmos consciência do luxo incrível que está reservado à minoria de que fazemos parte.
Por outro lado, evidentemente, a água consumida não tem toda a mesma qualidade e, quando contaminada, como acontece frequentemente, provoca inúmeras doenças na maioria dos países onde a AMI atua. E de várias formas: por ingestão (cólera, febre tifoide ou paratifoide, disenteria, diarreias infecciosas….) ou por contacto, já que é o habitat de vetores (mosquitos, moscas…) que provocam outras patologias tais como a malária, dengue, oncocercose (cegueira dos rios), febre amarela, doença do sono, etc...
E é por isso que a AMI, na sua ação, e em termos práticos, dá enorme importância a esta temática específica, seja financiando a construção de poços de água herméticos (para evitar a contaminação das águas) na Índia, Guiné, Senegal, Bangladesh, seja nas suas intervenções de emergência, pondo sempre a tónica na purificação da água, como aconteceu nas Honduras, ou vendo-se impelida a atuar no combate à epidemia da cólera como o fez na Guiné-Bissau o ano passado.
“Uma gota de água para vós, um oceano para nós” como ainda há uns anos me disse um chefe de aldeia no Senegal quando inaugurámos um poço construído com o financiamento da AMI.
Nessa medida, continuaremos a atuar, sempre, em nome da equidade, do desenvolvimento e da Paz.