Saltar para: Post [1], Comentários [2], Pesquisa e Arquivos [3]

Contra a Indiferença

A visão de um cidadão activo e inconformado com certos aspectos e da sociedade.

A visão de um cidadão activo e inconformado com certos aspectos e da sociedade.

Contra a Indiferença

09
Jan09

Que Portugal no perturbado mundo contemporâneo?

Fernando Nobre

No momento em que é grande a minha preocupação sobre a situação no Mundo quero lançar um veemente e esperançado apelo para a necessidade imperiosa de nós, Portugueses, tal como há cinco séculos, mostrarmos um espírito visionário, dinâmico e ousado, que nos ponha na vanguarda dos povos que, voltando-se para e abrindo-se ao Mundo, defendam as causas, a ética, os valores e os princípios, sem os quais não vejo, pessoalmente, futuro promissor para a Humanidade.

Sem pretender ser exaustivo, referirei alguns dos problemas mundiais candentes que já se nos apresentam e na solução dos quais Portugal deve empenhar cada vez mais a sua voz e as suas acções.

 

Os conflitos armados, muitos dos quais esquecidos, tendo como pano de fundo os vários nacionalismos, etnicismos, tribalismos, fundamentalismos...enfim, sempre a intolerância. É inadmissível e incompreensível que, no século XXI, em África, na Europa, na Ásia, nas Américas e no próximo e Médio Oriente persistam dramas incomensuráveis sem que os governantes da arena internacional e os seus órgãos económico-político-militares mostrem vontade e capacidade para lhes pôr cobro. Qualquer criminoso contra a Humanidade, qualquer governo incompetente, corrupto e assassino, goza de imunidade e ri-se da passividade das instâncias internacionais e das suas decisões e ameaças. Estamos em pleno reino da selva; da lei do mais forte. O Direito Internacional nunca foi, talvez, tão menosprezado, as decisões das Nações Unidas tão ignoradas e os Direitos Humanos tão espezinhados. Estamos no meio de uma profunda crise de valores, de uma total ausência de referências éticas.

 

Os movimentos migratórios do Sul e do Leste vão agravar-se sem que nenhuma política-fortaleza os possa conter. Só as árvores nascem e morrem no mesmo sítio.
Esses movimentos, que rapidamente se transformarão em verdadeiros rios humanos, virão desaguar nas nossas fronteiras e nas nossas cidades atraídos pela Europa - "Árvore de Natal". Eles são provocados pela péssima situação socio-económica em que vivem esses povos devido às guerras, aos fundamentalismos, à péssima governação (corrupção), à explosão demográfica e à degradação do eco-sistema (nomeadamente a desertificação).

Só uma acção de Solidariedade enérgica e urgentíssima, no sentido de uma Cooperação forte, activa e verdadeira que leve a uma melhoria significativa das condições de vida desses povos, nos seus próprios países, criando condições de um desenvolvimento sustentado poderá anular essa tendência migratória que já começou e que nos ameaça submergir. Tal não será possível sem se pôr cobro à desgovernação vigente em muitos países: a esse respeito o que se passa no Zimbabué é o perfeito exemplo. Ninguém, hoje, sabe dizer como é que a África sub-sahariana vai viver daqui a 20 anos, com o dobro da população actual. Não será então que as soluções de fundo terão de ser pensadas para um bilião e duzentos milhões de pessoas quando, já para este ano, o défice alimentar é superior a dois milhões de toneladas.

 

A desertificação vai ser só um dos problemas ecológicos que as próximas gerações, porque a nossa pouco ou nada fez, vão ter que enfrentar, se não começarmos já a tomar as medidas vitais para que o problema não se lhes venha a deparar insolúvel.

 

O reaparecer de movimentos políticos racistas e fascistas por toda a Europa, e em Portugal também, sem que os governantes pareçam poder ou querer reagir com medidas económicas e políticas enérgicas que lhes possam pôr cobro.

 

O desemprego com as subsequentes pobreza e exclusão social que atingem franjas cada vez mais importantes dos povos é o custo inaceitável de soluções económicas autistas e de uma má distribuição da riqueza existente. É necessário que cresça uma nova forma de solidariedade para com os pobres e que se ponha um travão às deslocalizações abusivas e nefastas de certas empresas globais hoje, infelizmente, mais poderosas que a maioria dos Estados.

 

Hoje em dia, ninguém pode dizer que não sabe, pois com a informação instantânea de que dispomos, temos todos obrigação de conhecer as questões fundamentais que se nos levantam. Não podemos também e sobretudo cair na descrença e na desmotivação do nada podermos fazer. Nós, cidadãos, nós, Sociedade Civil (de Portugal, da Europa e do Mundo) temos a força, a razão e a capacidade de intervir e de mudar o que quisermos e quando quisermos. Os povos não pertencem aos Governos, sejam eles nacionais ou supranacionais mas, sim, à Humanidade e, por isso, têm o direito e o dever de reagir e de exigir uma maior participação nas decisões que possam pôr em causa a sua existência presente ou futura.

Perante tal quadro, quanto a mim realista, é forçoso lutar com coerência, sem ambiguidades, sem compromissos e sem receios, pela defesa da Paz, da Liberdade e dos Direitos do Homem o que implica lutar pela defesa do nosso eco-sistema, do Direito Internacional, assim como pelo fim dos conflitos (nomeadamente o iníquo e intolerável descalabro humano vivido na Palestina).

 

Portugal, que deu mundos ao Mundo, que legou à História o Humanismo Universalista, que foi o iniciador do movimento que transformou a Terra numa Aldeia Global, levando os povos a conhecerem-se e as culturas a interpenetrarem-se (infelizmente nem sempre da melhor forma) Portugal demonstrou então, que podia liderar uma verdadeira revolução cultural mundial.

 

Hoje, também Portugal pode e deve liderar outra revolução mundial: uma revolução do foro ético, neste mundo cercado de perigos e ameaças que ainda não assimilou o ideal da Fraternidade, participando na génese de um novo paradigma humano: mais solidário, mais ético e mais justo.

 

No Mundo, na Europa e em Portugal os portugueses não podem adoptar uma atitude passiva, integrando um movimento isolacionista, de intolerância, de indiferença, que conduzirá à construção de uma inoperante e inumana Europa-Fortaleza. Portugal, que viu milhões dos seus filhos emigrarem e serem acolhidos em todos os continentes, deve recusar alinhar numa decisão cega e egoísta que só levará a maior desespero e revolta dos esquecidos e famintos que nos rodeiam e que merecem lhes seja dado tratamento humano.

 

Meus amigos, sendo um ser optimista - o que me levou a fundar a AMI, uma obra humanista de dignificação do Homem e de Portugal - acredito plenamente que temos razões para sermos um povo com confiança em si próprio, para não cairmos no conformismo e derrotismo dos perdedores e que podemos ser líderes na defesa intransigente e inegociável de valores e princípios que preservem e dignifiquem Portugal e a Humanidade e que possam desactivar as bombas-relógio que representam a pobreza, a fome e a violência. Como diz António Alçada Baptista no seu livro "O Riso de Deus": "A fome e a violência são absurdos de tal modo estampados na cara do mundo que, quem a isso não é sensível, é porque não se chegou a integrar na espécie humana".

 

Nós, Portugueses, e todos os povos do Mundo temos que fazer parte dessa espécie humana. Devemo-nos isso.

 

É na defesa e na dinamização desses princípios e valores éticos e humanistas universais que eu penso que Portugal, país pequeno em superfície mas grande na sua História e na sua gente, se pode empenhar tornando-se impulsionador. Uma visão do Mundo onde a Vida e o Cidadão sejam colocados no seu centro é a única solução para podermos continuar a caminhar todos em paz e em progresso. Nós, Portugueses, temos as potencialidades e a capacidade para participarmos activamente nesse processo humano, sem quaisquer complexos de inferioridade.

 

Esse caminho só pode ser um: o que leve ao desenvolvimento de todos os povos, respeitando-se mutuamente, ajudando-se mutuamente, nesta aldeia global que os nossos navegantes nos legaram.

 

Como escreveu Júlio Dantas num artigo sobre a Rainha Santa Isabel: " Que seria de Portugal se o seu povo tivesse perdido a sua generosidade e a sua dádiva para com os que sofrem? Porque ser Português é ter uma alma que se comove e vibra e chora quando perante a dor, o gesto nobre, o feito heróico, o amor. Foi essa generosidade que fez Portugal. Porque quando o povo quer, Portugal acontece".

 

Ao terminar, lembro-vos o que perguntava Jorge de Sena a concluir um poema sobre a liberdade após o 25 de Abril: "E agora, povo português?"
 

32 comentários

Comentar post

Pág. 1/2

Mais sobre mim

foto do autor

Subscrever por e-mail

A subscrição é anónima e gera, no máximo, um e-mail por dia.

FOTO DA SEMANA



LIVROS QUE PUBLIQUEI


- "Viagens Contra a Indiferença",
Temas & Debates

- "Gritos Contra a Indiferença",
Temas & Debates

- "Imagens Contra a Indiferença",
Círculo de Leitores / Temas & Debates


- "Histórias que contei aos meus filhos",
Oficina do Livro


- "Mais Histórias que Contei aos Meus Filhos", Oficina do Livro

- "Humanidade - Despertar para a Cidadania Global Solidária", Temas e Debates/Círculo de Leitores

- "Um conto de Natal", Oficina do Livro

Arquivo

  1. 2015
  2. J
  3. F
  4. M
  5. A
  6. M
  7. J
  8. J
  9. A
  10. S
  11. O
  12. N
  13. D
  14. 2014
  15. J
  16. F
  17. M
  18. A
  19. M
  20. J
  21. J
  22. A
  23. S
  24. O
  25. N
  26. D
  27. 2013
  28. J
  29. F
  30. M
  31. A
  32. M
  33. J
  34. J
  35. A
  36. S
  37. O
  38. N
  39. D
  40. 2012
  41. J
  42. F
  43. M
  44. A
  45. M
  46. J
  47. J
  48. A
  49. S
  50. O
  51. N
  52. D
  53. 2011
  54. J
  55. F
  56. M
  57. A
  58. M
  59. J
  60. J
  61. A
  62. S
  63. O
  64. N
  65. D
  66. 2010
  67. J
  68. F
  69. M
  70. A
  71. M
  72. J
  73. J
  74. A
  75. S
  76. O
  77. N
  78. D
  79. 2009
  80. J
  81. F
  82. M
  83. A
  84. M
  85. J
  86. J
  87. A
  88. S
  89. O
  90. N
  91. D
  92. 2008
  93. J
  94. F
  95. M
  96. A
  97. M
  98. J
  99. J
  100. A
  101. S
  102. O
  103. N
  104. D