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Contra a Indiferença

A visão de um cidadão activo e inconformado com certos aspectos e da sociedade.

A visão de um cidadão activo e inconformado com certos aspectos e da sociedade.

Contra a Indiferença

06
Set13

Que papel podem e devem ter as ONG Portuguesas e o Estado português no alcance das metas estabelecidas pelos Objetivos do Milénio?

Fernando Nobre

A 3 anos do prazo estabelecido para o alcance dos ODM, o relatório de 2013 sobre os progressos identificados em África, revela que 15 dos 20 países que mais progressos fizeram no sentido de alcançar os ODM, pertencem ao continente africano, indicando que a região está no bom caminho para alcançar 4 dos 8 objetivos (Ensino Primário, Igualdade de Género, HIV/SIDA, Malária e outras doenças, Parceria Global para o Desenvolvimento).

 

Ciente da sua responsabilidade enquanto agente de mudança, a AMI procura alinhar os seus projetos de desenvolvimento com a estratégia para alcançar os Objetivos de Desenvolvimento do Milénio, tendo, inclusivamente já vindo a apostar em algumas das áreas recomendadas pelo relatório de 2013, nomeadamente, através de um projeto de nutrição em S. Tomé e Príncipe, no âmbito do qual são ministradas consultas de nutrição, efetuadas avaliações nutricionais em clínica móvel a crianças, e é acompanhado e supervisionado o trabalho realizado pelos professores e cantineiras nas escolas; através de projetos de capacitação de organizações locais em áreas rurais da Guiné-Bissau e de S. Tomé e Príncipe, sendo de destacar um projeto desenvolvido na Guiné-Bissau com uma associação comunitária, constituída maioritariamente por mulheres; através da formação a técnicos de saúde locais na Guiné-Bissau e em S. Tomé e Príncipe; e através do apoio, em 2013, a 28 projetos em parceria com 27 organizações locais em 19 países.

 

No início de julho, a FAO anunciou que 38 países atingiram a meta de erradicar a fome e o relatório de progresso dos ODM de 2012 indicava que as metas de redução da pobreza extrema e da proporção de pessoas que não têm acesso seguro a fontes melhoradas de água potável para metade haviam sido atingidas, o que são sinais evidentes de progresso, mas não devem ser motivo para reduzir os esforços, uma vez que, segundo o relatório de progresso dos ODM de 2013, 1 em cada 8 pessoas permanece com fome e mais de 2,5 biliões de pessoas não têm condições de saneamento melhoradas.

Neste sentido só resta às ONG portuguesas e ao Estado português intensificarem o seu esforço com escolhas criteriosas das suas ações e maior capacitação de recursos humanos e financeiros. É nesse sentido que a Fundação AMI está empenhada.

 

Texto publicado na Newsletter "Impulso Positivo" de julho/agosto 2013

27
Fev09

Angola, o meu grito... o meu apelo!

Fernando Nobre

Escrevo sobre Angola, país que me viu nascer, já lá vão 57 anos. Porque decidi uma vez por todas na minha vida sobrepor ao “politicamente correcto” o “humanamente correcto” e porque já não aguento assistir à tragédia da grande maioria dos angolanos, e porque o meu silêncio se tornou ensurdecedor perante a minha consciência, quero lançar aqui um grito de dor e de protesto assim como um veemente apelo em nome de um povo heróico, mártir e esquecido: o povo angolano, o meu povo irmão. Na tragédia em curso há décadas, só e apenas ele é merecedor de carinho, respeito e admiração porque só e apenas ele está isento de culpas.

 

Culpados foram e são, porque se deixaram moldar pelas teias da política internacional e pela corrupção, uma boa parte dos seus dirigentes, passados ou presentes, no governo ou na oposição, a comunidade internacional com as suas gananciosas interferências e os seus planos de (des)ajustamento estrutural e certos governantes portugueses perfeitamente ignorantes da História e das gentes (tão merecedoras de carinho, respeito e admiração) de África em geral e de Angola em particular. A todos eles acuso de serem os responsáveis directos do genocídio passado e do sofrimento ainda em curso, em Angola. Nenhuma dessas entidades pode, nem poderá nunca furtar-se, em consciência, das enormes responsabilidades que teve e tem no germinar, no eclodir e no arrastar do indizível sofrimento e morticínio que esmagou e continua a esmagar o povo angolano. Activa ou passivamente, embora em diversos graus, todos incentivaram (ou cinicamente fingiram que não era nada com eles) o desentendimento e a desconfiança mortais, a corrupção escandalosa, o armamento desenfreado, a ganância sem limites, a indiferença assassina, a cobardia irresponsável... Em suma, o desgoverno total que engendrou uma Angola, sofrida e mutilada por várias gerações, onde coexistem um punhado de multimilionários cleptopatas e milhões de miseráveis que deambulam perdidos e deslocados, na esperança muitas vezes vã de encontrarem uma instituição que lhes acuda com um pouco de arroz, alguns medicamentos e um agasalho, ou, na sua falta, uns restos num contentor de lixo, com que enganar a fome e morrerem silenciosamente...ignorados!

 

Conseguiram assim, transformar um grande e riquíssimo país (talvez por isso mesmo!), embora hoje em fase de recuperação, sobretudo em Luanda e nas capitais provinciais, num dos países com maior grau de destruição, com maior número de amputados e de minas antipessoais e com menor índice de desenvolvimento do Mundo: a nefasta sinergia da corrupção, da incompetência, da cobiça e indiferença internacional perante o sofrimento alheio, assim como a mortífera intolerância entre os angolanos fizeram de Angola, com as suas fabulosas potencialidades humanas, agrícolas, pecuárias, piscatórias, mineiras (diamantiferas, petrolíferas e muito mais), cinegéticas, turísticas ... um amontoado de miséria que deveria comover o mais insensível e empedernido dos homens fosse ele angolano ou estrangeiro, simples cidadão ou governante. Pelos vistos, os responsáveis directos por todo esse descalabro ainda não se comoveram... a matança dos inocentes continua! Anonimamente…


Angola tem hoje, finda a guerra civil mortífera em 2002 que para os responsáveis directos tudo parecia explicar e justificar..., a derradeira ocasião de se reencontrar. Essa ocasião não pode ser desperdiçada: acabaram os subterfúgios, as mentiras e as desculpas descabidas. Os angolanos, e essencialmente eles, com particular responsabilidade para os seus dirigentes, têm o dever e a possibilidade de reporem Angola no mapa do Mundo, tornando-a num exemplo para toda a África. Tal só acontecerá se os governantes e a sociedade civil angolana agarrarem com unhas e dentes os poucos trunfos de que Angola dispõe, nomeadamente o seu povo, os seus minérios, as suas enormes potencialidades agropecuárias, piscatórias, turísticas e o petróleo. Desde já lanço um alerta aos dirigentes africanos mais clarividentes e responsáveis: em certos círculos geopolíticos anglosaxonicos já se ousa falar e escrever da necessidade, como sempre em nome do bem dos povos, de se começar a pensar na eventualidade da utilidade de uma nova recolonização...noutros moldes... evidentemente... CUIDADO! Tal não pode acontecer mas só não acontecerá se, de uma vez por todas, os dirigentes interiorizarem que o maior património dos seus países é o seu povo, sendo por isso fundamental investir na educação, na saúde e numa agricultura diversificada, em vez de se iludirem com o agastado discurso do país “Grande” e “Rico”; se fizerem as leituras correctas, com as implicações decorrentes, do que está a acontecer na perversa e nada ética revolução mundial em curso, e se pugnarem verdadeiramente pela tolerância e concórdia nacional (estou a pensar especificamente em Cabinda, atropelada pela História da descolonização e sempre sofredora) e implementarem a Democracia e uma Boa Governação que, como é óbvio, não se coaduna de modo nenhum com a tentacular corrupção que foi e é, quanto a mim, a maior responsável do estado em que Angola e África estão, com nefastos e devastadores efeitos equiparados, ou até superiores, aos da guerra. É tempo de se assumir esta verdade!


Só assim, acredito, é o meu sonho!, o povo angolano alicerçado no seu sofrimento e sustentado pela sua sociedade civil, embora ainda fraca e dispersa mas cada vez mais sensibilizada, organizada, interveniente e exigente poderá enfim construir uma sociedade democrática e encontrar o caminho da Paz, da Concórdia e da Responsabilidade que o conduzirá ao amanhã radioso com que há tanto sonha e ao qual tem direito, como todos os povos. É da mais elementar justiça e não lhe resta outra alternativa para sobreviver!

 

Não posso terminar sem fazer um último apelo: que o povo português nunca esqueça, apoiando-os, os povos irmãos angolano e cabinda com o qual partilha tantos laços de sangue e de História. Eles merecem.
 

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