Alterações climáticas e as crises humanitárias iminentes!
No dia da partida de uma equipa da AMI para as Filipinas, onde se irá juntar à equipa que está no terreno desde o dia 12 de novembro a prestar assistência à população afetada pelo Tufão Haiyan ou Yolanda na Ilha de Leyte, e perante mais um impasse na Conferência do Clima em Varsóvia (como já tinha acontecido na cimeira Rio+20, onde estive presente), apesar dos discursos e apelos emocionados dos delegados das Filipinas, tomo a liberdade de publicar um texto que escrevi para o editorial da revista AMINotícias (n.º 43) em 2007 e que, infelizmente, continua muito atual.
Desde a Cimeira do Rio em 1992, sobre alterações climáticas e o subsequente Protocolo de Quioto, que os EUA e a China nunca ratificaram, forçoso é constatar que pouco ou nada se fez no que diz respeito às causas responsáveis pelas alterações climáticas do nosso planeta.
O que aconteceu desde então, pese embora a urgência das respostas perante as alterações constatadas (os inquietantes “efeito de estufa” e “aquecimento global”) bem como a elevada previsibilidade das suas tremendas consequências, consubstanciou-se sobretudo, e isto foi muito positivo independentemente dos responsáveis políticos globais, na esclarecida e decisiva tomada de consciência do problema por parte da emergente Cidadania Global. Como consequência dessa metamorfose cívica, ocorreram umas parcas, diminutas e tímidas medidas de contenção por parte de alguns governos e da União Europeia. Mesmo estes, não souberam estar à altura das suas responsabilidades ao não reagirem e atuarem com a determinação exigida a curto e médio prazo, remetendo as aplicações concretas dos objetivos medíocres anunciados para prazos dilatados ou até mesmo para as calendas gregas.
E assim, no pântano da indecisão e incompetência, já se passaram 15 anos! Nestes 15 anos, poderíamos e deveríamos ter sido muito mais ambiciosos e audaciosos na poupança de matérias-primas através da reciclagem, na substituição dos hidrocarbonetos (do petróleo, do carvão e do gás como fontes energéticas absolutas) e na consequente diminuição das emissões de CO2.
Já então tínhamos as capacidades tecnológicas para o fazer! Faltou, repito, a vontade e a determinação políticas, assim como a sensibilidade humanística por parte do imenso poderio do “complexo petroquímico” que não quis, e continua a não querer até hoje, prescindir de uma parte dos seus fáceis e faraónicos lucros obtidos a partir da exploração das jazidas de matérias fósseis, quase sempre sem as justas contrapartidas de bem-estar para as populações dos países “produtores”. Pelo contrário, veja-se a miséria oferecida aos nativos, do Médio Oriente à costa ocidental de África, como contrapartida da exploração do ouro negro. Faltou igualmente, por parte da sociedade civil organizada, e aqui fica o mea culpa, uma sensibilização adequada e sustentada junto das sociedades dos países mais ricos no sentido da contenção do seu consumismo de modo a contribuírem para um desenvolvimento equitativo e sustentado global do nosso planeta.
Em vez de prevenir, preferimos remediar! Eis-nos agora perante a iminência de catástrofes cataclísmicas provocadas pelo aquecimento global, tais como:
- derretimento dos glaciares polares, da Gronelândia e dos picos glaciares onde tínhamos as maiores reservas de água doce do planeta (em breve, por exemplo, já não haverá neve no cume do Kilimanjaro...);
- catástrofes naturais, tais como secas, inundações, tufões, ciclones e furacões (um acréscimo de 30% em 2007 comparativamente a 2006!);
- aumento da fome devido às repercussões que as alterações climáticas terão nas colheitas;
- fluxos de refugiados e deslocados climáticos e guerras pelo controlo dos recursos hídricos;
- subida do nível da água dos mares e oceanos com o desaparecimento já previsto e anunciado de ilhas (no Pacífico e no Índico) e de significativas regiões das orlas costeiras em todos os continentes, incluindo na Europa (ex: região da Camarga, em França) onde já se começa a pensar, como medida preventiva, na construção de diques como os existentes na Holanda;
- ressurgimento de doenças tropicais, tais como a malária, o dengue e a febre amarela, nomeadamente no Sul da Europa (e por isso, em Portugal também) devido à expansão das áreas propícias a insetos vetores (mosquitos...);
Tais consequências são já consideradas irreversíveis, faça-se o que se fizer hoje, para os próximos 25 a 30 anos! Já amanhã! Tal foi assumido no relatório anual de 2007 do International Institute for Strategic Studies que refere que essas alterações poderão provocar conflitos internacionais “equivalentes a uma guerra nuclear” e também pelos delegados do Grupo Intergovernamental de Peritos sobre a Evolução do Clima. Por isso, as Nações Unidas estão a prever necessitar um montante adicional de 4 mil milhões de USD no seu orçamento, sobretudo para reagir às crises humanitárias climáticas em 2008...
Será preciso mais para acordarmos todos? Ou será que já escolhemos um futuro autofágico e suicida? De que estamos à espera? De mais discursos e mais cimeiras como a que decorreu em Bali, na Indonésia, que juntou cerca de 13 mil pessoas e 190 países, com muita retórica e modestos e dececionantes objetivos práticos?
Em nome da humanidade, de todos nós, dos nossos filhos e netos É PRECISO ATUARMOS JÁ, mesmo tendo em conta a irreversibilidade próxima de algumas funestas consequências, resultado da nossa total cegueira das últimas duas a três décadas. O nosso Planeta já não aguenta e não tolera mais os nossos desmandos globais. Não temos sabido escutar e interpretar os muitos sinais anunciadores de mudanças e, por isso mesmo, não soubemos ainda adaptar-nos corretamente aos novos tempos e às suas prementes exigências; temos sido péssimos gestores do nosso bem-estar futuro. Mais levianos e incompetentes é difícil. Somos todos responsáveis da não assistência ao nosso planeta em perigo! É, pois, já, uma questão de vida ou de morte! Mais vale um acordar violento do que os cantos de sereia com que alguns irresponsáveis e incompetentes gananciosos globais nos querem adormecer, levando-nos ao suicídio coletivo.
A AMI, como gotinha de água que é, está a atuar e prepara-se para o que aí vem. Está a atuar em Portugal e no Mundo. Como? Aumentando e reforçando as suas iniciativas de reciclagem (RX, consumíveis informáticos, telemóveis, óleos alimentares...), iniciadas há 12 anos, desafiando empresas e cidadãos para a compensação das suas emissões de CO2 através da plantação de árvores autóctones (Projeto Ecoética); alargando a sua rede de apoio social em Portugal e atuando em mais de 45 países de todos os continentes, tentando criar, com as nossas equipas e os nossos parceiros locais, as condições de desenvolvimento sustentáveis para as suas populações, tendo sempre em mente o nosso futuro global coletivo.
Estamos também a preparar-nos para o que pensamos ser, desde já, inevitável: tragédias climáticas e fluxos migratórios massivos. Como? Alargando a nossa rede de contactos globais, criando uma rede social de apoio forte e alargada em Portugal e reforçando as nossas capacidades humanas, logísticas e financeiras para que nos permitam atuar sempre que necessário e possível...
Ao tentarmos antecipar-nos às crises, prevendo-as “tanto quanto humanamente é possível fazê-lo”, e ao tentarmos adaptar-nos às mudanças já inevitáveis, pretendemos, só e apenas, dar o nosso contributo positivo. É a nossa gota de água na construção da Paz e da Harmonia globais. É apenas uma gotinha, mas dela não prescindimos, em nosso nome e em nome dos nossos filhos e netos!
Com todos vós, estou certo, vamos conseguir!