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Contra a Indiferença

A visão de um cidadão activo e inconformado com certos aspectos e da sociedade.

A visão de um cidadão activo e inconformado com certos aspectos e da sociedade.

Contra a Indiferença

24
Dez12

O Fim de um Ciclo - Um apelo veemente a favor do Humanismo e da Cidadania activa, responsável, global e solidária

Fernando Nobre

 

Estamos à beira do precipício. Se nada for feito já, imediatamente, daqui a cinco, dez anos no máximo, estaremos no caos social e de regresso às guerras e às ditaduras na Europa. Não se trata de pessimismo, é antes um sentimento profundo alicerçado na minha observação do Mundo das últimas décadas.

As causas são, infelizmente, sobejamente conhecidas e até históricas: irresponsabilidade, insensibilidade humana e social, ausência ou esquecimento e abandono dos valores essenciais e norteadores, corrupção e ganância doentias e desenfreadas, políticas e políticos sem estratégias nem rumos, a não ser a subjugação aos mercenários económicos e financeiros que não olham para o outro como um irmão e um ser humano. Enfim, sempre o mesmo cavalgar frenético e descontrolado do egoísmo, indiferença, intolerância e ganância.

O que, já por vezes cansado, vou repetindo há décadas em conferências, artigos e livros, é uma gritante evidência. E relembro apenas três dos muitos apelos que fui fazendo:

 

  • "Apelo ao surgimento e fortalecimento de um Novo Paradigma de Sociedade Global Solidária e Tolerante só possível com um novo ímpeto espiritual. Dar-se-ia um claro sinal motivador à Humanidade desalentada, desmotivada, inquieta, angustiada, humilhada e revoltada com tantos e tamanhos desmandos!"

 

  • "É chegado o tempo das grandes opções de fundo, das decisões e acções estruturais corajosas, que permitam reequilibrar as forças das três componentes essenciais da Sociedade Humana (Estado/Mercado/Sociedade Civil) a fim de que o Ser Humano e a sobrevivência do NOSSO Planeta sejam sempre o Alpha e o Omega de todas as preocupações como Patrimónios Essenciais da Humanidade que verdadeiramente são."

 

  • "O Futuro da Humanidade pertence-nos. Cabe-nos a nós, Cidadãos e Cidadãs, se determinados e porventura motivados, imprimir um decisivo salto qualitativo no nosso destino colectivo, fazendo que as nossas utopias de hoje sejam as realidades de amanhã. Acredito decisivamente, eu, o por vezes céptico e pessimista de cicatrizes físicas e psíquicas adquiridas ao longo de toda a minha caminhada humanitária global esperançosa mas também sofrida, que o Optimismo da Vontade se há-de sobrepor sempre ao Pessimismo, quantas vezes compreensível, da Razão. Os desafios que a nossa Humanidade já enfrenta devem imediatamente implicar Mudanças radicais de percepções e comportamentos."

 

Como evitar as ora inevitáveis explosões sociais de povos levados à miséria, à exaustão e à indignação por décadas de governações incapazes, injustas e nalguns casos até verdadeiramente irresponsáveis e corruptas levadas a cabo por verdadeiros delinquentes políticos?

O fosso entre os 10% mais ricos e os 10% mais pobres de entre os Estados e de entre as pessoas nunca foi tão abismal! Com a agravante da franja dos mais pobres estar a crescer. A responsabilização dos causadores desse desmando global continua a não importar que seja feita!

Os vendedores da banha da cobra, os ilusionistas e os demagogos pululam!

Em nome dos sem voz e dos sem rosto, dos miseráveis com quem me cruzo no Mundo, e no meu País também, sinto-me obrigado a gritar: Basta! Falem verdade! Cumpram as promessas! Expliquem os verdadeiros porquês deste lamaçal olhando-os bem nos olhos, em linguagem entendível e falem às mentes e aos corações com extrema sensibilidade e justiça social. Só assim encontraremos caminhos de esperança e uma réstia de optimismo. Sem essa inteligência e humanismo, saltaremos todos para o abismo, para a total insegurança, feita de anarquias e guerras. A Humanidade não precisa disso, não merece isso! Será que só perceberemos irremediavelmente tarde?

Ponhamos fim à geopolítica do caos, da fome, das guerras, da irresponsabilidade! Reforcemos o novo paradigma da cidadania global solidária e responsável que lute e alcance maior equidade e justiça social. Mudemos as mentalidades.

Por favor, não há mais tempo a perder! Esgotou mesmo! Urge reagir! Todos e cada um de nós.

25
Nov11

O Futuro de Portugal

Fernando Nobre

O texto que se segue foi proferido numa conferência, no dia 27 de Junho de 2010, por ocasião de uma iniciativa da Câmara Municipal de Arcos de Valdevez, denominada "Concelho de Estado" e que dedicou esta primeira edição ao Doutor Mário Soares, sua vida e obra.

Fui convidado para participar, dando a minha opinião sobre o futuro de Portugal.

 

Aqui fica, tal e qual foi escrito e dito no que ao futuro do nosso país diz respeito.

 

Como tudo poderia ser tão diferente se estes gritos tivessem sido ouvidos e entendidos e as soluções aqui preconizadas tivessem sido adoptadas e concretizadas...

 

 

Doutor Mário Soares,

Excelências,

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

Meus Amigos,

 

 

Ao falar do futuro de Portugal não posso, nem por um instante, não ter permanentemente em mente todos os portugueses, nos quais incluo todos os falantes da língua portuguesa, seus ascendentes e descendentes.

 

Portugal é uma Nação com quase nove séculos de história e é uma das poucas nações que marcou indelevelmente a história da Humanidade. Portugal é da dimensão do mundo!

 

O futuro de Portugal não é pois despiciendo! Importa assim, que o acautelemos desde já!

 

É bem verdade que atravessamos momentos muito difíceis mas também não é menos verdade que no nosso percurso histórico já atravessámos momentos semelhantes, ou até bem piores. E a verdade é que o povo português sempre encontrou força anímica, líderes, arte e engenho para encontrar soluções inteligentes, criativas, humanistas e positivas que permitiram a nossa caminhada colectiva enquanto nação até aos nossos dias.

 

Embora esse dado histórico alentador deva obstar ao derrotismo, ao pessimismo e ao fatalismo do momento, o que é facto é que Portugal se encontra hoje numa encruzilhada muito delicada que exige decisões e acções coerentes, urgentes e de médio a longo prazo que precisam de ter como base de sustentação o mais largo consenso nacional possível.

  

Se é verdade que a situação hoje é muito mais complexa porque enquadrada num contexto financeiro, económico, político e social mundial e europeu extremamente instável, e sobre o qual não temos talvez qualquer ou nenhum meio de intervenção, como factor extrínseco que está fora do nosso alcance, também é verdade que temos factores intrínsecos particularmente gravosos e sobre os quais podemos actuar a menos que aceitemos, de ânimo leve, perder a soberania que ainda nos resta.

 

Para mim é aqui que está o cerne da questão. Ou abdicamos e aceitamos ser a curto prazo uma espécie de protectorado da liderança europeia (entenda-se: Alemanha) ou reagimos já, combinando um plano de emergência nacional, de curtíssimo prazo, e um plano estratégico nacional de médio-longo prazo. Esses planos exigem consenso e o empenho da mais vasta plataforma nacional possível: partidos políticos, sindicatos, associações patronais, mundo associativo, mundo académico e cidadãos. Temos e devemos, quanto antes, alcançar, repito, um consenso nacional perante a eminência de uma gravíssima crise nacional. E, mais importante, ninguém pode ou poderá eximir-se dessa tarefa. Portugal precisa de trabalho e acção. Só com pura retórica não vamos lá!

 

Nós sabemos quais são os nossos problemas: dívida externa e juros da dívida incomportáveis, défice insustentável, desemprego desmoralizador, justiça pouco célere e não equitativa, administração pública pesada e não isenta, que já consome 14% do PIB e 30% das despesas públicas, sistema fiscal pouco incentivador, educação medíocre e que não premeia a excelência, falta de pontualidade, desrespeito por prazos e compromissos, falta de competitividade, salários baixos, dependência energética e alimentar francamente estrangulador, destruição do nosso tecido produtivo (agricultura, pescas…)… e despesismo excessivo do Estado e das famílias que há pelo menos duas décadas vivem largamente acima das suas possibilidades, recorrendo aos créditos fáceis e não se preocupando nada em constituir poupanças…

 

 

Chegou pois o momento de dizer BASTA com verdade e frontalidade. Permitam-me a metáfora: estamos com uma hérnia estrangulada e temos que a operar antes que surja a peritonite e a morte.

 

Como?

 

 

A – UM PLANO DE EMERGÊNCIA QUE IMPLIQUE:

 

1 - O corte nas despesas públicas a começar pelo encerramento imediato de centenas ou milhares de institutos e fundações públicas inúteis, salvo para os seus gestores, que só aprofundam o défice das nossas contas públicas.

 

2 - O terminar com certas parcerias público-privadas que têm penalizado gravemente o orçamento do Estado.

 

3 - A adopção de medidas moralizadoras nos salários, mordomias e reformas dos servidores de topo do Estado inclusive das empresas públicas.

 

4 - A racionalização dos meios utilizados em todos os serviços da Administração Pública, evitando desperdícios e duplicação de funções, sejam eles civis ou militares.

 

5 - A discriminação positiva do IVA e do IRS a fim de que os esforços dos cidadãos sejam equitativamente e proporcionalmente repartidos evitando penalizar a fracção mais pobre ou remediada da nossa população.

 

6 - O congelamento de todos os megaprojectos apostando os investimentos públicos no apoio às PME para a redinamização do nosso tecido produtivo (agricultura, pescas, energias limpas) e a reabilitação dos nossos centros históricos, monumentos e museus essenciais para a nossa atracção turística (Ásia/China).

 

 

B – UM PLANO ESTRATÉGICO DE MÉDIO A LONGO PRAZO (=DESÍGNIOS)

 

Deverão ser constituídos já grupos de trabalho com peritos das diferentes áreas estratégicas entendidas como “Desígnios ou Causas Nacionais” que permitam garantir a sustentabilidade da nossa Paz Social, do nosso Desenvolvimento e da nossa Democracia.

 

Esses peritos deverão ser reconhecidos e respeitados pela sua integridade e competência e ser nomeados pelos partidos políticos, sindicatos, associações patronais, associações cívicas, academias e universidades. Esses grupos de trabalho deveriam ter metas temporais para apresentarem as suas propostas de modo a atingir os objectivos pretendidos.

 

As áreas em análise deveriam ser quanto a mim:

 

  • A Segurança Social: deveria ter em conta a protecção dos mais desfavorecidos e criação das condições para uma distribuição equitativa da riqueza nacional entre os cidadãos e entre as regiões do País

 

  •  O Sistema Fiscal: justo, equitativo e incentivador.

 

  • A Educação: qualidade, rigor e excelência que prepare os portugueses para a cidadania e competência profissional.

 

  • A Saúde: qualidade tendo em atenção, sobretudo, os mais carenciados e uma classe média depauperada.

 

  • A Justiça: independente, imparcial e liberta de sujeições políticas.

 

  • A Economia: pautada pela iniciativa privada assente numa economia social de mercado atenta às necessidades das populações e aos direitos e deveres dos trabalhadores e na qual o Estado teria uma efectiva e célere função reguladora e fiscalizadora não se demitindo de participar e, se necessário, controlar pilares da economia essenciais para a soberania do Estado.

 

  • A Administração Pública: isenta e apartidária, ao serviço do povo e subordinada à competência e ao mérito nas nomeações.

 

  • O Sistema de Segurança Interna:que equacione ajustadamente as necessidades de protecção do Estado e das vítimas, observando os direitos, garantias e liberdades dos cidadãos.

 

  • A Alimentação, Energia e Ambiente: procura tanto quanto possível, da auto-suficiência alimentar e energética e sustentar sem falhas a preservação do nosso ambiente.

 

  • A nossa Zona marítima exclusiva: valorização e exploração integral da nossa área exclusiva (águas e subsolo).

 

  • O Espaço da língua e influência portuguesa: potenciar o nosso espaço a nível mundial com a afirmação da representação externa de Portugal e a exportação dos nossos produtos, serviços e cultura tendo em conta o formidável trunfo que constituem o universo dos falantes da língua e cultura portuguesa no Mundo e onde as nossas comunidades antigas e recentes são do maior relevo.

 

  • A Nossa Juventude ter uma atenção muito especial pois sem ela não há nem haverá futuro para Portugal.

 

  • A Preservação Ambiental: essencial para o futuro sustentável do nosso País.

 

 

Excelências,

Minhas Senhoras e Meus Senhores,

Meus Amigos,

 

 

Acredito sinceramente num futuro próspero e sustentável para Portugal desde que saibamos criar sinergias e consensos entre nós e aceitemos TODOS sacrifícios proporcionais aos nossos meios num diálogo construtivo em prol da salvaguarda da soberania do nosso Estado. Já não há volta a dar. Chegou a hora de encarar a realidade. Possamos estar todos nós à altura das nossas responsabilidades enquanto cidadãos a fim de darmos a resposta que a situação da Nação clama e exige.

 

É tempo de marcharmos todos contra os novos canhões que nos atingem: o fatalismo, o chico-espertismo, a partidarite aguda, paralisante e sufocante, a corrupção, a irresponsabilidade, a incompetência, o laxismo. É tempo de aprender a premiar o esforço, o trabalho, o talento, o mérito, a competência, o espírito de sacrifício e valorizar o conhecimento, acabando com as nossas crónicas e destrutivas maledicência e inveja.

 

Portugal e os Portugueses merecem e querem ter um futuro condigno para que os Capitães de Abril e uma das insignes figuras do País, o Doutor Mário Soares, brilhem sempre na História de Portugal!

 

É este o meu desejo mais sincero.

É esta a minha visão para o futuro de Portugal. Exemplaridade e Esperança!

 

Muito obrigado!

 

29
Out10

A experiência do voluntariado no contexto da globalização

Fernando Nobre

Escrevi este texto em 2001. Continuo a acreditar que o exercício de uma cidadania activa e consciente traz benefícios que vão muito além do que, à partida, se espera. 2011 será o Ano Europeu do Voluntariado. Deitemos mãos à obra! Os cidadãos devem envolver-se em causas. Devem acreditar. Só assim poderão sentir-se parte da solução. Não nos desiludamos. Não baixemos os braços. Não nos divorciemos do nosso país. Ele é de todos nós! De cada um de nós.

 

 

Permitam-me, antes de mais, que vos fale um pouco da globalização. Como é de todos sabido, a globalização não é um fenómeno da nossa época já que ela encontra nos episódios mais remotos da humanidade a sua verdadeira génese. Já os Romanos quiseram fazê-la em toda a Europa e nós, Portugueses, contribuímos decisivamente para que ela se alargasse ao mundo então conhecido. O que a globalização dos nossos dias tem indiscutivelmente como característica própria é a grande velocidade a que ela se processa, aliada a um progresso científico e técnico ímpar na história da humanidade, uma comunicação global e uma liberdade de movimentação financeira desregrada e sem o mínimo controlo. A globalização actual associada a uma quebra significativa da influência política tende efectivamente a estar quase exclusivamente na posse do grande capital financeiro, para não falar do capital financeiro especulativo, deixando à margem desta globalização grandes franjas da humanidade. Esta globalização trouxe indiscutivelmente grande instabilidade e uma profunda exclusão já que se sobrepôs ao ideal político e menosprezou por completo as profundas preocupações sociais, culturais, ambientais, éticas e morais que deviam ter sido apanágio do século XX.

 

Vivemos hoje, indiscutivelmente, uma revolução mundial que parece querer ser conduzida unicamente pela força do mercado pondo à margem o homem que devia ter sido sempre o objectivo final de toda e qualquer globalização. É por isso que a sociedade civil, hoje, no mundo, protesta e se manifesta, não contra a globalização em si, mas contra “esta” globalização, apelando a uma globalização alternativa para que um outro mundo mais justo, mais ético, mais solidário seja possível. Face a esta tendência, que não passa de uma tendência,  promovida pelo Fórum Económico Mundial de Davos há cerca de 30 anos e que pretende impor uma globalização com marcadas tendências financeiras e especulativas, é fundamental que a sociedade civil se constitua como contrapoder, não para tomar o poder mas para defender valores. Os cidadãos têm a obrigação de promover e defender valores.

 

Não é por acaso que alguns autores falam da globalização armadilhada. Nesta globalização puramente economicista e produtivista só 20% da mão-de-obra seria necessária, sendo os outros 80% perfeitamente dispensáveis e descartáveis.

  

O mercado parece, assim, ter sido eleito como nova ideologia e não é por acaso que muitos lhe chamam o Deus Mercado. Foi por isso que em 2001 se realizou, pela primeira vez, na cidade do Porto Alegre, no Brasil, o Fórum Social Mundial para que justamente a sociedade civil mundial pudesse dar voz ao seu desalento, exprimir o seu repúdio pelo que se vinha processando na nossa sociedade e para apresentar alternativas ao processo em curso dizendo bem alto que uma outra globalização é possível, como um outro mundo é possível e que há alternativas credíveis ao processo que uma minoria planeou e que está a executar em detrimento de uma larga franja da humanidade que se vê assim excluída, talvez irreversivelmente, de todo o processo de desenvolvimento a também tem direito.

 

É verdade que o fosso que se tem acentuado entre pobres e ricos tem sido encapotado por eufemismos linguísticos. Por exemplo, hoje fala-se nos “países menos avançados” quando, anteriormente, se falava dos países “em vias de desenvolvimento” ou, mesmo antes, dos “países subdesenvolvidos”. Não é menos verdade que, em menos de 30 anos os países hoje ditos menos avançados passaram de 29 para 59. A África que era auto-suficiente no aspecto alimentar há 20 ou 30 anos, recebe hoje 4/5 dos seus bens alimentares, o que faz desde já antever uma catástrofe humanitária de proporções bíblicas quando sabemos que a África subsariana, que tem hoje 800 milhões de habitantes, passará para o dobro em menos de 25 anos. A esse empobrecimento real de uma boa parte da humanidade associa-se uma política de dois pesos e duas medidas: os ditadores são ou não aceites consoante aceitem ou não as “regras do mercado” e a ele se dobrem e com ele pactuem. Pouco importa a desgovernação e a corrupção desenfreada desde que sejam submissos às leis e imposições do Fundo Monetário Internacional e do Banco Mundial.

 

Um dos grandes efeitos perversos da globalização especulativa em curso foi, sem dúvida nenhuma, a queda das ideologias. Todos os políticos têm o mesmo discurso, hoje quem manda é indiscutivelmente o poder económico-financeiro especulativo. É constrangedor ver como os ex-ministros são hoje funcionários dos grandes grupos económicos. É sem dúvida alarmante apercebermo-nos que, intimamente associado a esse poder económico, predomina também o mundo da comunicação que já só fala de “conteúdos” - noção abstracta e manipuladora, tendo esquecido por completo o seu dever informativo e formativo. Hoje há um Poder cada vez mais perigoso e inquietante, um Poder sem rosto, globalizado, incontrolado. Há cada vez mais multinacionais (com fácil acesso ao crédito bancário, que é, de facto, o verdadeiro poder) a beneficiar de orçamentos superiores aos de muitos estados desenvolvidos e os seus presidentes são autênticos chefes de estado. Sem saberem já quem os representa e quem os governa, não é por acaso que os sindicatos perdem força e influência e as pessoas se alheiam cada vez mais da vida política como prova o facto de a abstenção em actos eleitorais ser hoje o maior partido europeu.

 

É cada vez mais importante despertar as consciências para uma cidadania efectiva. É aqui que o voluntariado encontra permanentemente toda a sua expressão. É fundamental, pois, promover uma cidadania crítica, em permanente alerta, atenta, interventiva e é esta atitude que sustenta o voluntariado. Os cidadãos têm que assumir uma atitude activa e participativa. Sem participação da sociedade civil não pode haver autêntico desenvolvimento nem verdadeira democracia. É esse o drama, nomeadamente em África, porque, pese embora começarem a ter uma sociedade civil activa, ela é ainda incipiente e extremamente frágil. Daí os desvarios permitidos a governos perfeitamente corruptos e sem a mínima noção de estado e do bem público.

 

O voluntariado é, pois, a solidariedade activa e não apenas “de boca”. Perdeu-se muito o conceito de subsidiariedade, não responsabilizando os cidadãos pelos seus deveres e desvalorizando a sua efectiva participação na vida social.      

 

É bom não esquecermos que, se vivemos hoje em democracia, não significa que assim possamos estar daqui a 20 ou 30 anos. A Democracia será tanto mais perene quanto mais a sociedade civil estiver implicada e informada pois só assim servirá de travão a movimentos radicais de intolerância, de fundamentalismos diversos, de xenofobia...

 

É pois fundamental o movimento associativo e o voluntariado. É este pilar que condicionará positivamente o evoluir da nossa sociedade. Por esse movimento passará indiscutivelmente a sobrevivência das causas nobres e dos valores éticos. Só com uma sociedade civil atenta e participativa de mãos dadas com o voluntariado informado é que efectivamente poderemos combater o que tenho dito serem as duas piores doenças da humanidade: a indiferença e a intolerância.

 

Os desafios que a Humanidade tem de enfrentar são enormes mas tenho a convicção de que os cidadãos saberão responder positivamente tanto no que diz respeito à defesa do ambiente como à condução de uma ajuda humanitária verdadeiramente credível e não manipulada por outros interesses menos claros, como no combate sem tréguas à pobreza e à exclusão social e também numa luta sem quartel contra toda a forma de intolerância. Num mundo em que a ausência de políticas corajosas gera a ausência de causas, estou convicto que uma sociedade civil forte e activa saberá lutar por essas causas, as eternas causas universais, as causas dos valores, porque é disso que estamos à espera, duma globalização de valores e sobre isso, sem dúvida nenhuma, o voluntariado tem uma palavra decisiva a dizer. Estou certo que a dirá.

    3 de Dezembro de 2001

 

06
Abr09

Globalização: "SER" ou "TER"?

Fernando Nobre

Desafio gratuito? Debate e opção fúteis e inúteis? Escolha impossível? Penso que não. Será um desafio gratificante, julgo eu, se a opção “ser”, a acertada para mim, for a escolhida; não é seguramente a mais fácil mas será aquela que, nos momentos derradeiros, mais nos realizará e nos reconfortará!

 

 

Acredito plenamente que o “ser” tem que se sobrepor ao “ter”. Sei que não é o sentimento dominante neste início de século preocupado por uma globalização essencialmente financeira e especulativa, pelo vírus da ganância que galopa na mente de certos “yuppis” e de certas “empresas”, por uma tecnologia que parece tudo explicar e dominar e por uma visão maniqueísta das relações humanas que pretende conduzir-nos para perigosos desvios militaristas assim como para um choque de civilizações e religiões obsoleto porque retrógrado, sem cabimento e esperança e causador de tanto sofrimento e morte. O terrorismo e o combate que lhe está a ser travado são epifenómenos que decorrem das contradições e efeitos negativos quando o “ter”, irreflectidamente, tem a pretensão e ousadia de se sobrepor ao “ser”. A actual guerra contra o terrorismo está enferma de inutilidade e morte porque manifestamente desadequada e incompleta: só feita de tiros, torturas, prisões arbitrárias e cárceres fora das normas jurídicas, humilhações e mortes não nos levará a parte nenhuma a não ser a mais terror: será uma espiral infernal para todos, mesmo para aqueles, os do “ter”, que pensam ter-se posto ao abrigo nos condomínios fechados ou outras torres de marfim...

 

 

Meus amigos, há poucos anos ouvi no Centro de Convenções de Washington o então presidente da Organização Cooperação e Desenvolvimento da Europa, Sr. Jean Roger Bovin fazer uma análise da situação mundial que me reconfortou ainda mais na minha opção de pretender apenas “ser” e de lutar nesse sentido. Disse então o Sr. Bovin que “a pobreza impede o desenvolvimento social e o progresso”, “que o crescimento económico não conduz obrigatoriamente ao desenvolvimento social”, e que “o desenvolvimento social não é alcançado sem um investimento sério na saúde e na educação”. Afirmou também que “a democracia e a miséria não podem coexistir” e que por isso “é fundamental investir no desenvolvimento social para se almejar ter democracia”. E alertou para o facto da ”Nova Ordem Mundial” sonhada pelo outrora presidente George Bush (pai!) ter falido e se assistir a um aumento acelerado das disparidades! E mais, alertou também que previa para 2020 (amanhã!) que a África iria pôr no mercado de trabalho duas vezes mais jovens do que a Europa, EUA, Japão e Rússia, juntos!, o que provocaria uma corrente migratória Sul – Norte nunca vista... Sábias observações e temíveis previsões... Pois é, eis o resultado que a aposta no “ter” estéril produziu no nosso planeta: um crescimento económico sem desenvolvimento social integrado e global.

 

 

O “ter” é ilusão, é pura aparência, é efemeridade, é indiferença, é intolerância, é enfermidade, é solidão. O “ter” não tem esperança porque se esgota nele próprio, alimenta-se dele próprio exigindo sempre mais “ter”! Que saída para essa quadratura do círculo, para esse não senso que alguns tentam erguer em novo paradigma querendo fazer-nos crer que é a única via para a resolução dos problemas da humanidade? Só há uma: inversão de marcha em direcção ao “ser”. Não é fácil, espera-nos muita frustração (tanto maior quanto menos “ser” houver...) e alguma satisfação sobretudo aquela de sabermos que, no mais íntimo do nosso ser, estamos no caminho certo, na única via para a criação da Paz e da Harmonia entre os seres humanos.

 

 

“Ser” é humanidade, consciência social, livre arbítrio, liberdade, igualdade, fraternidade, solidariedade, cultura, preocupação ambiental, ecumenismo, tolerância, aceitação e preocupação do outro... Este é o meu pensamento, a minha opção, o meu testamento. Não de um rato de sacristia!, mas de um cirurgião que muitas vezes teve vidas entre as mãos, de um operacional que percorreu o Mundo e de um homem que sabe perfeitamente como é a morte e que gostaria de a enfrentar olhos nos olhos com o mínimo de angústia e medo. Só e apenas isso. Tentar “ser”.

 

 

E se tentássemos todos?

 

29
Mar09

A crise sistémica: algumas das minhas certezas...

Fernando Nobre

Posso desde já afirmar algumas certezas, pese embora as dúvidas e inquietações que me assolam, sobre o que nos está a acontecer e sobre o que poderá advir, em Portugal e no Mundo, se não soubermos reagir…

 

Algumas certezas:


- Sem o restabelecimento da insubstituível CONFIANÇA entre os cidadãos, os governantes, os empresários e o sistema financeiro, vulgo banca, será de todo impossível sair-se da presente espiral negativa criada pela ganância e a irresponsabilidade de uma certa “liderança” enferma de egocentrismo e indiferença.


A desconfiança hoje profundamente enraizada em todos os quadrantes da sociedade é o factor decisivo que condiciona negativamente tudo o resto.


Sem se tomarem as decisões imprescindíveis e urgentes na política e na justiça (regulamentações diversas, julgamento rápido dos prevaricadores e imediata confiscação de todos os seus bens, estejam onde eles estiverem, em seus nomes ou não…), decisões que devem ser vistas como essenciais par a salubridade ética e moral de uma sociedade e de um sistema financeiro completamente pervertidos porque engendrados por mentes enfermas de ganância, sem o mínimo bom senso, e desconectadas da realidade, a CONFIANÇA não regressará e então nada será possível. Nem em 2009, 2010, 2011, ou 2012…


- A derrocada em curso já provocou pelo menos o surgimento de mais duas centenas de milhões de pobres no Mundo: nos países mais pobres mas também no seio dos países até agora definidos como ricos ou desenvolvidos. A esse respeito a procissão só agora chegou ao adro e mais centenas de milhões de pobres e de miseráveis surgirão até que se consiga estancar a hemorragia do desemprego e da desesperança.


– Sem uma MUDANÇA RADICAL DO PARADIGMA sobre o qual se alicerçou a Sociedade Humana vigente, há décadas ou mesmo há séculos, não há saída sustentável para a actual crise sistémica. Se essa MUDANÇA PROFUNDA DE COMPORTAMENTOS não ocorrer, e quanto mais depressa melhor, podemos estar certos que a instabilidade financeira, económica, social e política irá agravar-se e desembocará numa crise de regime profunda em todo o Mundo que gerará conflitos globais, sociais e militares, tremendos.


Não é por acaso, meus amigos, que se assiste desde já a manifestações da fome e que todas as grandes potências têm em curso aumentos orçamentais brutais e acelerados para o reforço e a modernização dos seus arsenais bélicos: algo de extremamente grave está em gestação.


Os “líderes actuais” responsáveis da “Ideologia Económica do Desastre”, por convicção ideológica ultraliberal, por subserviência ou demissão perante o desregulado poder financeiro ou por mera ganância ou incompetência, não pensem que bastará apenas fazer uma superficial cirurgia estética (para povo ver e ser ludibriado), para continuarem, ficando tudo na mesma, a actuar como fizeram até hoje!


Tal não será exequível, pois não só é anunciadora de desastres ainda mais profundos mas também porque os povos já não querem mais esse sistema gerador de profundas desigualdades e de indizível sofrimento. Repito: vai ser necessária uma MUDANÇA RADICAL DE PARADIGMA DAS MENTALIDADES, DAS POLÍTICAS E DOS GOVERNANTES A TODOS OS NIVEIS. UMA NOVA SOCIEDADE ESTÁ EM MARCHA E É IMPARÁVEL. QUEM AINDA NÃO ENTENDEU ISSO NÃO PERCEBEU NADA, NÃO OLHA PARA O FUTURO E ESTÁ A QUERER MERGULHAR-NOS NO ABISMO.
CABE DESDE JÁ, OU CABERÁ MUITO EM BREVE, À SOCIEDADE CÍVIL MUNDIAL SOLIDÁRIA ERGUER A MURALHA CONTRA A DESGRAÇA.


- Os mercados terão que ser muito mais regulados, as Off Shores (paraísos das fraudes e outras evasões fiscais) terão que ser banidas, os Estados vão ter que controlar os pilares mestres do seu sistema bancário, segurador, energético e hídrico (e não abrir mão evidentemente dos seus sistemas de segurança interna e externa assim como das suas relações exteriores…), e será necessário regulamentar com um mínimo de ética e bom senso as obscenas disparidades actuais nos salários (e outros bónus) e nas reformas!


- É urgentíssima a estabilização do Mercado e o fim dos cortejos de despedimentos, dos layoff e dos trabalhos precários, causas, senão mesmo sinónimos, de maior pobreza e miséria. É agora porque em 2010, 2011 ou 2012 já será tarde demais porque com o rebentamento das Bombas Sociais o equilíbrio societário será rompido com consequências imprevisíveis!


O expoente máximo dessa miséria humana reflecte-se nas situações, verdadeiramente dramáticas, vividas pelos sem-abrigo. A AMI sabe alguma coisa a esse respeito pelo acompanhamento que faz dessa problemática (com os seus 9 Centros Porta Amiga e os seus 2 Abrigos para os sem-abrigo), há já 15 anos no nosso País!


É pois urgentíssimo o combate estruturado e sem tréguas à pobreza. Há anos que falo e escrevo sobre essa matéria. Temos de fazer do combate à nossa pobreza, a nossa grande vergonha colectiva, uma verdadeira CAUSA NACIONAL (e GLOBAL!). Afirmei-o ainda recentemente perante o Senhor Presidente da República, Professor Cavaco Silva, o qual, na sua conferência de imprensa, no final da honrosa visita que fez às instalações da AMI na cidade do Porto, por ocasião do seu 5º Roteiro para a Inclusão, também salientou a necessidade desta Causa Nacional.

 
Meus Amigos, estas são algumas das minhas certezas, ou das minhas “verdades”, que convosco quis partilhar.

 

06
Mar09

Eis o tempo de reagir!

Fernando Nobre

É chegado o tempo da acção e da opção: sempre pela Positiva!
Pois a Esperança não pode morrer!

 

É sabido que estamos a viver tempos muito difíceis e que os próximos, 2010- 2011…, serão provavelmente ainda mais duros.
Sabemos que o ultra liberalismo selvagem, erguido como novo “deus” inquestionável e dogmático, foi o errado paradigma de sociedade que enfermou boa parte das mentes das “elites” políticas, económicas e financeiras que governaram o nosso Mundo nas últimas décadas.


Esse sistema que estava errado nas suas premissas, a boa auto-regulação dos mercados e a correcta redistribuição da riqueza produzida, e que favoreceu de forma medonha o egoísmo feroz e o ego doentio da esmagadora maioria dos seus mentores e executantes, provocou uma derrocada de dimensões ainda inimagináveis.


Porque indiferentes perante a miséria e o sofrimento da maioria significativa da população do nosso planeta, esses “líderes” dos Direitos, e apenas e só dos Direitos, entraram em levitação estratosférica, eufórica e irresponsável, drogados e dopados por todos os produtos tóxicos que criaram, sem os controlar, e pelas engenharias financeiras que engendraram conscientemente para justificarem os seus obscenos salários e miríficos bónus. A infernal espiral estava montada e tinha que ruir, como ruiu, agravando terrivelmente a exploração, o sofrimento e a morte dos mais frágeis no Mundo.


Estamos nesse ponto e caímos num poço que parece não ter fundo. O sistema ruiu de podre e exige ser substituído, e não remendado depressa e toscamente...


Atenção: querem-nos fazer crer, os mesmos que puseram o Mundo num caos e com isso se enriqueceram imenso, criando e beneficiando-se de todo esse desvario, que tudo tem solução com umas pequenas operações plásticas, um pouco de ervanária e muita acção de mau malabarismo. Errado!, como já grito há pelo menos dez anos.


Temos, TODOS, de criar um novo paradigma de Sociedade HUMANA, com novas políticas e novos políticos sempre supervisionados pelos CIDADÃOS.


Na Europa, e em todos os países, tal como aconteceu com Obama nos EUA, pese embora as resistências e limitações existentes à indispensável MUDANÇA que ele tenta introduzir, temos que encontrar NOVOS POLÍTICOS capazes de implementar NOVAS POLÍTICAS mais solidárias, corajosas, éticas e transparentes, e capazes de traçar novos rumos a fim de que possamos sair do charco lamacento e desesperante onde estamos.


Os actuais líderes europeus estão comprometidos, até ao tutano e à exaustão, com o regime que ruiu porque foram eles que o criaram, impulsionaram, defenderam ou permitiram até há bem poucos dias. Lembram-se? Para mim eles JÁ não servem porque não merecem CONFIANÇA, por não terem a mínima CREDIBILIDADE e porque tenho as mais sérias dúvidas da sua genuína vontade e capacidade em serem os agentes da mudança que o Mundo reclama. Não são capazes: é uma questão de coluna vertebral!


Então, o que nos resta? O desespero total? NÃO, nada disso.


Restamos NÓS, OS CIDADÃOS, com o DEVER indeclinável de agarrarmos o nosso futuro, votando em quem quisermos sem nunca mais permitirmos que os políticos, sejam eles quem forem, usem os nossos votos como cheques em branco e com isso fazerem o que bem entendem sem nos consultar como se fossemos uns débeis ou uns carneiros que se deixam levar docilmente ao abate. Esse tempo tem que acabar de vez ou seremos todos co-responsáveis da destruição das nossas vidas e do nosso Planeta.


Como disse tão bem um dia o Doutor Mário Soares temos o direito sagrado à indignação!


Temos que ter a coragem e determinação:
1º - de exigirmos e conseguirmos desde já, na presente crise, que os responsáveis directos desta tremenda derrocada, sejam eles quem forem, sejam responsabilizados criminalmente, sem apelo nem agravo, e tenham os seus bens penhorados até ao limite dos desfalques (= roubos) feitos ao longo dos últimos anos,


2º - de fazermos compreender aos políticos, presentes e futuros, sejam eles quais forem, que não toleraremos nunca mais que:
- o sentido dos nossos votos seja desvirtuado e que, de ora em diante, exigiremos que os compromissos eleitorais sejam respeitados por eles, uma vez eleitos, e que não abdicaremos de ser consultados sempre e quando matérias de relevante interesse Nacional, ou municipal, estejam em causa (como, por exemplo, nos casos recentes: cobertura política e logística vergonhosa da iníqua guerra contra o Iraque, inclusive os voos da CIA, a ratificação ou não do Tratado de Lisboa, a descaracterização da estação fluvial de Alcântara por contentores…).
- o dinheiro dos nossos impostos seja desbaratado pela corrupção ou projectos desnecessários (ex: 10, dez!, estádios de futebol para o Euro 2004)
 

São apenas exemplos… Poderia escrever muito mais mas seria redundante. Penso que ficou claro o que quero dizer:
TEMOS QUE APERFEIÇOAR A DEMOCRACIA REPRESENTATIVA COM UMA COMPONENTE, ESSENCIAL, DE DEMOCRACIA PARTICIPATIVA EM TERMOS GLOBAIS E LOCAIS E TEMOS QUE REFORÇAR O CONCEITO E A PRÁTICA DA “CIDADANIA GLOBAL SOLIDÁRIA”, NUMA REDE FORTE E COESA, PORQUE INADIÁVEL E INSUBSTITUÍVEL.


Agora em Consciência e Liberdade totais que cada um vote e actue agora e no futuro como lhe aprouver!
 

15
Fev09

Democracia e Democratas: ALERTA!

Fernando Nobre

Um dos erros mais graves que poderíamos todos cometer para o nosso futuro colectivo seria pensarmos que a Democracia, ainda existente na Europa e no nosso país, é perene. Nada é perene!


Tenho o hábito de dizer que a Democracia é uma flor como a papoila: persistente mas frágil! Renasce sempre, mesmo nos terrenos mais rochosos e inóspitos, mas também uma vez colhida e acomodada, murcha e morre rapidamente. Estamos em risco de viver esta última fase. Ainda vamos a tempo de a evitar se soubermos TODOS reagir.


Os alertas repetitivamente lançados nos últimos tempos, em artigos e livros, por pessoas sensatas, moderadas e informadas que conheço e por quem nutro amizade, o maior respeito e a máxima consideração tais como Mário Soares, Adriano Moreira, Almeida Santos, Ramalho Eanes, Loureiro dos Santos, Garcia Leandro, Carvalho da Silva, Miguel Sousa Tavares, Dom Duarte e muitos outro (e eu próprio há muitos anos) devem ser entendidos como verdadeiros gritos de alarme sobre o estado da nossa sociedade.


Estamos todos cientes que as crises que vivemos (financeira, económica, institucional, partidária e de valores) podem fazer ruir, mais rápido do que os incautos e irresponsáveis pensam, o sistema democrático. Não tenhamos medo de o afirmar. Estamos a viver o fim de um regime sem sabermos o que o irá substituir, nem como, nem quando.


O que eu sei, e assim penso e escrevo há alguns anos, é que chegou o momento das grandes opções de fundo e que os problemas globais que enfrentamos exigem uma governação global com ética, autoridade, bom senso e humanidade.


A crise em curso, associada a um desprestígio e descrédito profundos das instituições (sistemas financeiros, governos, partidos políticos, Justiça…), minando profundamente os fundamentos dos estados de direito, pode dar a oportunidade esperada aos movimentos ou partidos neonazis, fascistas, xenófobos e racistas. Eles estão atentos e preparam-se activamente em redes europeias e mundiais. Não menorizemos a questão pois tal alheamento poderá ser fatal às nossas sociedades ainda democráticas.


Os responsáveis por tudo isso têm rosto e nomes: somos todos nós, pela nossa indiferença e cobardia; são os responsáveis financeiros pela sua ganância desenfreada; são os empresários e a sua irresponsabilidade social; são os políticos fracos, demissionários e corruptos; são as religiões e a sua sede de poder, cada vez mais desfasadas em relação ao Divino; é a Justiça a várias velocidades; são os partidos e a sua lógica de poder de curto prazo e de satisfação das suas devoradoras clientelas.


Os efeitos do aprofundamento da pobreza e do desemprego, quanto a mim a procissão só vai no adro, já começaram e fazem temer o pior: discursos políticos xenófobos, mesmo dentro da União Europeia, violam impunemente as suas leis perante uma liderança europeia comprometida, fraca e inoperante, como no Reino Unido e na Itália (os demagogos medrosos já estão à solta…); ataques racistas, cada vez mais violentos e até mortais, crescem como ervas daninhas em vários países europeus; os proteccionismos e os medos, de péssima memória, regressam a galope!


Perante estes factos temos que reagir todos em força e imediatamente. As Democracias podem murchar e morrer, como as papoilas, perante as crises sociais que se vislumbram, aparentemente inevitáveis e que já amedrontam muitos.


Aos novos Desafios Globais (miséria, fome, clima, armas, guerras…) devemos responder com novas Respostas Globais (cidadania global, solidariedade global, valores universais tal como a honestidade, a dignidade e o respeito pela vida, todas as vidas!). Perante velhas e recorrentes Ameaças (fascismo, racismo, xenofobia, ditaduras…) temos que nos erguer e contrapor, sem tibiezas, medos ou cobardias, com as velhas e eficazes Armas de sempre (liberdade, resistência, fraternidade, coragem, luta…) mas de forma mais organizada, estruturada e empenhada: é chegado o momento de o fazermos.


No que me diz respeito continuarei a Alertar Consciências e a Lutar por Valores que defendem a vida, os mais fracos e a Democracia. Nas próximas eleições para o Parlamento Europeu darei, como independente e a título pessoal, o meu apoio àqueles que a meu ver melhor defenderão o que me parece essencial defender, numa Europa em crise e em perigo: os excluídos e a Democracia.


É nesse sentido que, com a AMI, reforçarei a nossa missão “Aventura Solidária” do Senegal ao Brasil, passando pela Guiné-Bissau, e que em Maio deste ano organizaremos um Fórum Internacional em Lisboa sobre o tema “Encontro de Culturas – Ouvir para Integrar”. Essas duas acções vão no sentido de criar pontes de diálogo e de entendimento entre povos e culturas, combatendo a intolerância, o desconhecimento, o subdesenvolvimento, a xenofobia e o racismo, e para melhor se entender as razões profundas das migrações. Aliás, nesse sentido, o meu próximo texto no blog será sobre “Imigração”.


Termino por onde comecei. Democracia e Democratas: ALERTA! A crise económica que apenas começou pode pôr tudo em questão: inclusive a Paz Social e a Democracia na Europa acomodada! ALERTA!
 

05
Fev09

A Geopolítica do Caos e da Fome

Fernando Nobre

O texto que se segue foi escrito em Dezembro de 1998, há mais de 10 anos (incluí-o também no meu livro "Gritos Contra a Indiferença")...

 

Constato, infelizmente, que tinha razão!...

 

De regresso de várias viagens -  à Guiné-Bissau (via Senegal) durante o último Verão, para apoio às populações vítimas da guerra; de uma estadia no Bangladesh onde a AMI está a financiar um projecto junto dos miseráveis deslocados pelas recentes inundações; de uma passagem por Nova Iorque, a convite da Fundação Konrad Hilton para participar num seminário sobre o Humanitário e o século XXI; e de uma missão humanitária nas Honduras para socorrer as vítimas do ciclone Mitch - devo confessar que concordo com o Sr. Ignacio Ramonet, director do “Le Monde Diplomatique”: estamos a caminho do caos. Ou paramos já (para escutarmos e socorrermos os gritos de desespero de ¾ da população mundial, para olhar e ver os erros cometidos nomeadamente na defesa do Homem e do meio ambiente e para pensarmos no que realmente queremos fazer do nosso mundo) ou todo este frenesim descontrolado pode levar-nos mesmo ao caos global.
Hoje, os políticos, os economistas e os financeiros estão todos ultrapassados, tentando no máximo gerir o dia a dia, pela rapidez com que a globalização se fez e pela instantaneidade com que os colossais fluxos financeiros se movimentam, destabilizando regiões inteiras num jogo virtual especulativo, perverso e perigosíssimo para o mundo inteiro. Estamos em equilíbrio muito instável em cima de um castelo de cartas que pode ruir de repente, levando consigo toda esta aparente e falsa tranquilidade. A falência do banco Barings e os efeitos do “el niño” e da “el niña” já deviam ter sido suficientes, entre muitos outros sinais de alerta, para nos chamar à razão e ao bom senso!

As revoluções tecnológica (tendencialmente desumanizante), económico – financeira (verdadeiro jogo como no “mercado dos futuros”!!) e social (a crise global do poder/ desemprego) em curso, estão a levar ao domínio total do financeiro sem rosto sobre o político, o social, o ético e o moral com todas as terríveis consequências. Sem querer ser o Velho do Restelo, grito: alerta!, cuidado!

Com tanto miserável no nosso mundo onde umas 300 pessoas acumulam mais riqueza do que 3 biliões (50% da população mundial), onde o fosso entre o Norte e o Sul nunca foi tão abissal, onde as disparidades sociais nos países ditos civilizados e desenvolvidos nunca foi tão grande, isso só pode rebentar. Quando? Não sei! Só sei que assim não vamos a parte nenhuma. É tempo de inverter a marcha funesta que nos tem conduzido. Por favor, é preciso bom senso.

Após ter estado num espaço de um mês em Gabu, na Guiné, em Nova Iorque e a sua frenética Wall Street, em Bogra, no Bangladesh e em Tegucigalpa nas Honduras, estou em estado de choque. Não aceito tão fantásticas disparidades; não é humanamente suportável. Eu não consigo conviver com isso sem gritar a minha angústia, revolta e indignação e sem tentar, convosco, fazer algo de positivo pelos sofredores, pelo nosso mundo.
Peço-vos, pois, para reagirem. À escala individual, sejamos solidários. Não à indiferença, não à intolerância, não ao caos que alguns estão a oferecer a tantos, em nome de coisa nenhuma a não ser a insensatez e a cobiça. Temos, cada vez mais, de continuar juntos a nossa luta. Só ela dá sentido à vida.

 

Publicado na AMInotícias nº14 - 1998

06
Jan09

Impacto social da crise económica e financeira

Fernando Nobre

Neste texto, embora focalizado nos tremendos impactos sociais que a crise económica e financeira em curso terá inevitavelmente nos planos Nacional e Mundial, não me poderei eximir de comentar certos aspectos políticos, económicos e fiscais embora, estou ciente, outros autores os abordarão de forma muito mais exaustiva do que eu.

O primeiro comentário é que hoje ninguém está capacitado para poder prever, com o mínimo de rigor e credibilidade, qual será a verdadeira duração e a real gravidade, antevendo-se desde já que será profunda, da actual crise nas economias dos países, e dos seus povos, nem que novo sistema financeiro e económico emergirá após o fim desta tormenta.

E ninguém o pode fazer porque ninguém pode afirmar categoricamente que não haverá outros “casos” Madoff , BPN e afins que não venham a explodir amanhã. Daí resulta a extrema falta de confiança que hoje está profundamente instalada dentro do próprio sistema financeiro e que tanto bloqueia o crédito inter-bancário!

Uma coisa é certa: o sistema em vigor ruiu (e só as injecções ou avais massivos de cerca de três milhões de milhões de USD por parte dos Estados e dos Bancos Centrais - dez vezes o que seria necessário em quinze anos para se conseguir os vitais Objectivos Do Milénio - evitou a derrocada total!) e urge agora encontrar um novo paradigma nas relações económicas e financeiras entre os estados e os bancos.

Ficou demonstrado, penso eu e também o ex-presidente da FED, Sr. Greenspan, que a auto-regulação, tão exigida e propalada até há pouco pelos defensores do liberalismo total do mercado, o novo deus e o novo abre-te sésamo para o desenvolvimento e felicidade globais, faliu redondamente.

Faliu porque, progressivamente, se evoluiu para um sistema financeiro cada vez mais especulativo e irreal, não alicerçado na economia real mas sim substituído pela famigerada “economia virtual ou de casino” com os seus inúmeros “subprimes”, incontroláveis “produto tóxicos” e outros “derivados” em que já ninguém tinha mão e que ruíram como castelos de areia à primeira ventania. Era o delírio do jogo da roleta russa. A ressaca só podia, como foi, ser violenta: inúmeras instituições mortas ou nos cuidados intensivos e milhões de pessoas "ao Deus dará"...

Faliu porque estavam em causa homens, e apenas homens, falíveis, sem sistemas eficazes de contrapesos, que se deixaram facilmente infectar pelo “vírus da Ganância”(dixit Sr. Greenspan). Em estado eufórico de levitação estratosférica, apenas pensaram em satisfazer os seus enormes egos e descabidos apetites de mordomias assim como as insaciáveis exigências das assembleias gerais de anónimos sócios.

Faliu porque, por razões várias, os sistemas de regulação não funcionaram, mesmo quando aparentemente suficientes, os sistemas de fiscalização dos Bancos Centrais estavam distraídos ou não tinham os meios para exercerem cabalmente as suas funções e as grandes empresas de auditoria foram coniventes ou omissas para não perderem tão importantes contratos...

Faliu porque grandes especialistas em questões fiscais, sociedades gestoras e de advogados..., se profissionalizaram junto das off-shores e dos diversos paraísos fiscais para subtrair os seus clientes às suas normais obrigações fiscais perante os seus Estados. Estados esses, sem meios para desvendar as teias extremamente complexas montadas para esses fins. Daí a impunidade que usufruem até hoje a esmagadora maioria dos grandes crimes de colarinhos brancos...

Faliu porque muitos Estados, e os seus políticos, se demitiram da sua imprescindível responsabilidade na correcta e atenta gestão da Res Publica como se tem observado na Grécia, Islândia,...

Perante essa doença, com múltiplos agentes patogénicos, é evidente que a abordagem terapêutica será complexa e levará bastante tempo a surtir efeito. Já não é hora para homeopatias. Terá que se combinar cirurgia com medicinas agressivas porque de uma grave situação gangrenosa se trata! A medicina tradicional chinesa mostrou que tem, neste caso específico, melhores soluções que todas as nossas caducas teorias...

Agora uma coisa é certa: serão tremendos os efeitos desses verdadeiros desvarios e desnortes em 2009, 2010, 2011... nas economias dos países mais frágeis, que ficarão arrasadas, como serão tremendos os efeitos no agravamento do desemprego e da exclusão social dentro das nossas sociedades ditas, até agora, desenvolvidas. Poderão vir a estar mesmo em causa a paz social e a democracia, ainda vigentes nas nossas sociedades!

Como efeitos imediatos estão remetidos para as calendas gregas os objectivos que se pretendiam atingir: um comercio mundial mais justo e equilibrado, com a Ronda de Doha (que esteve bloqueada 7 anos para agora sumir de vez), e os 8 Objectivos do Milénio (ODM) que nunca serão atingidos em 2015, como se pretendia, nem em 2050, quanto a mim!

É de temer fortemente, nos países em vias de desenvolvimento, já em estado permanente de sufoco financeiro, sobre-endividados, sem acesso aos créditos e sem qualquer margem de manobra, explosões sociais preocupantes, como consequência da desagregação completa do tecido social, do desemprego massivo e do alastrar da fome...

Tal não é de excluir também nos nossos países, onde inevitavelmente os encargos sociais dos Estados vão aumentar brutalmente, assim como o desemprego, a criminalidade e as tensões sociais. Serão necessárias por parte dos governantes e de todos nós uma atenção e sensibilidade social redobradas para que possamos evitar o pior.

O mais preocupante ainda, como se o que referi anteriormente não o fosse já sobejamente, é que a confiança dos cidadãos nos seus governantes, bancos e sociedades gestoras, foi gravemente atingida. Poderá levar muito tempo antes que a confiança se restabeleça e estimule o consumo interno que é, com o investimento público, das poucas alavancas que dispomos para inverter a tendência depressiva da economia, antes que ela entre em deflação!

É pois imperioso e urgente que as lideranças voltem a demonstrar aos seus concidadãos que estão mais preocupadas com os seus próprios Deveres, do que com os seus Direitos, e apenas Direitos! Se isso não acontecer rapidamente, as ondas de choque desta grave crise quase sistémica serão avassaladoras e a derrocada pode desde já estar anunciada. Nesse caso, um novo paradigma de sociedade humana levaria décadas a ser implementado.

Desde já apelo ao reforço da Cidadania Global Solidária e ao empenho total e convergente das três componentes de um Estado que se quer moderno e mobilizador: estruturas políticas do Estado verdadeiramente democráticas, geridas com responsabilidade e transparência, não receando ouvir os seus cidadãos e que acatem o sentido do seu voto (o que infelizmente os governos, ainda democráticos, da UE não pretendem fazer em relação ao voto dos irlandeses sobre o futuro do Tratado de Lisboa...), forças económicas e financeiras empreendedoras, responsáveis e cidadãos e sociedades civis organizadas, activas, exigentes, solidárias e transparentes.

Se assim não for, tanto a nível Nacional como Global, estaremos então todos em péssimos lençóis, e por tempo indeterminado.

É esta a minha sincera opinião.
 

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